A Guerra de Canudos




   

     Após dois governos militares, dos Marechais Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto, o Brasil teve o primeiro Presidente civil: Prudente de Morais. A capital da República era o Rio de Janeiro. Haviam embates políticos entre Republicanos pró-Prudente de Morais e Jacobino - militares florianistas, que rivalizavam ainda com os restauradores monarquistas.
      No interior da Bahia surge o líder Católico Antônio Conselheiro, que teve grande importância no período republicano, após várias andanças pelo nordeste do Brasil. Em 1893 surge o povoado de Canudos. Defensor da monarquia e de um estado teocrático (algo citado nas quartas prédicas de Antônio Conselheiro), lutaram ainda por melhores condições de vida para seu povo, em situação calamitosa, diante da falta de apoio da República e ainda. Não havia na República uma política social para melhorar a vida dos sertanejos e isso estava em desacordo com a ideologia de Antônio Conselheiro. Ainda assim, o alvo principal do movimento era a formação de uma vida em comunidade, religiosa e mais justa. Não um movimento de levante monarquista (apesar de também passar pela restauração desta, pois a justiça e a religiosidade para eles não estavam na República). Mas não se pretendia invadir nenhum lugar, enfrentar o Exército ou a polícia. Queriam viver em paz, na sua comunidade religiosa, de trabalho e cooperação.



De itinerante a estabelecer-se na fazenda de Belo Monte, no sertão da Bahia, fundou o arraial de Canudos, um local degradado e sem nenhuma infra estrutura, que paulatinamente, foi melhorando e ganhando novos adeptos. Com seguidores mestiços e negros, pessoas humildes e exploradas pelos fazendeiros da região, teve um crescimento de adeptos - o que incomodou os políticos, latifundiários e a própria igreja Católica (era sim, um movimento em grande parte religioso). Conselheiro teve grande oposição na própria igreja, além da oposição de republicanos e jacobinos. Na capital se intensificava a oposição às ideias de Antônio Conselheiro, provocando embates políticos entre florianistas e jacobinos. Isso foi crescendo com o passar do tempo. Canudos não representava perigo para o Estado brasileiro antes de 1897 - na visão daqueles envolvidos com o governo.
      O início dos conflitos se deu em Juazeiro/BA, em 1896, com a chegada do Juiz Arlindo Leone. Inicia-se então o boicote a pedidos por madeiras e outros materiais para construção de novas igrejas, por parte do grupo do beato Antônio Conselheiro, que já rivalizava com o próprio juiz em outras causas, em outras localidades do sertão. O primeiro enfrentamento foi contra as forças policiais da região, e agravados, iniciou-se o enfrentamento contra as forças republicanas (Exército). A morte do Marechal Floriano Peixoto, em junho de 1895, agravou a situação política na capital, entre Jacobinos e Republicanos. E com a morte do Coronel Moreira César em 1897, da ala radical do Exército Brasileiro, intensifica-se a pressão por uma solução rápida para o conflito, já que o povoado de Canudos era tido como inimigo da República, justo por fazer apologia à monarquia (o que apesar de ser verdadeiro, nunca foi o foco do movimento). Além disso, havia um sentimento de desonra para o Exército, por causa das sucessivas derrotas e mortes de líderes expressivos, dentro da hierarquia militar.
      Com a fundação do partido monárquico, em 1895, em São Paulo e no Rio de Janeiro em 1896, ocorreu grande pressão de pessoas que eram influentes no período monárquico (como jornalistas, políticos, burocratas e aristocratas da sociedade) que perderam prestígio e privilégios com o fim da monarquia. A situação política se agrava na capital do Brasil, colocando Canudos como inimigo primeiro da República do Brasil.
      A cizânia política continuava. O governo voltou a fazer acordos econômicos com Portugal, o que levou os jacobinos à ira. Estes atribuíam a Portugal o atraso do Estado brasileiro. Licenciado por problemas de saúde, Prudente de Moraes deixa o cargo para Luís Vianna, e Manuel Vitorino, respondendo pela presidência, não poupava críticas ao governo baiano pela não solução do problema de Canudos. Com isto, Luís Vianna se viu obrigado a aceitar o radical militar Moreira César para a incursão a Canudos, pois o governo da Bahia não conseguia a solução para o problema social e político no governo republicano. Com a volta de Prudente de Moraes à presidência e com a morte de Moreira César, a cizânia política levou a tomada de decisão drástica que seria melhor destruir Canudos em nome da sobrevivência da República, pois os jacobinos desmoralizavam o governo republicano, dizendo ser este complacente com o problema de Canudos na Bahia. Os republicanos, pressionados pelos jacobinos só tinham uma solução: destruir Canudos em nome da República e retomar a dignidade do Exército nacional.
     Em 1897, o governo republicano manda uma força desproporcional à de Canudos (a quarta expedição) e massacra o povoado. Antônio Conselheiro, que faleceu dias antes do final do massacre, teve seu corpo exumado pelo Exército Brasileiro, sua cabeça decepada e exposta como troféu. O Marechal Carlos Machado de Bittencourt - Ministro da Guerra, saiu como herói da conquista, junto ao governo de Prudente de Moraes, personificando o valor da república brasileira, calando as críticas dos jacobinos.
     Os republicanos venceram Canudos e foi constatada a mentira ideológica implantada pelos jacobinos contra o movimento de Conselheiro. A vitória desmascarou duas frentes: a mentira jacobina e a descoberta de um plano frustrado para matar o presidente Prudente de Moraes na capital. Tudo idealizado pelos jacobinos. E assim, se deu o fim político desse grupo no período republicano do Brasil.
     Canudos foi massacrado e sem nenhuma atenção por parte de qualquer grupo no Brasil República. O movimento liderado por Conselheiro foi na verdade, uma mentira implantada pelos jacobinos (de que era um movimento monarquista e portanto, uma ameaça direta à República).
    Euclides da Cunha lançou em 1902 o livro “Os Sertões”. Como jornalista e correspondente do jornal "O Estado de  São Paulo” narrou as atrocidades vividas pelos sertanejos ao serem massacrados em Canudos.
     No filme de Sérgio Rezende (1997), intitulado "Guerra de Canudos" podemos ter uma visão magistral dos acontecimentos daquela guerra.  

DESTINO DOS ÓRFÃOS DE CANUDOS

     
       Com o fim da Guerra de Canudos, os órfãos da guerra são tratados de forma desumana pelos soldados e pessoas que usaram de influência e poder para levar várias crianças e adolescente rumo ao escravismo em Salvador e outras regiões do Brasil, isso em pleno ano 1897.  
     Com a criação do comitê patriótico da Bahia, tendo como secretário Lelis Piedade, teve uma contribuição imensurável no destino e na liberdade de várias crianças do holocausto social que foi a guerra, que durou entre 1897 a 1901. Uma movimentação pública do comitê, alcançou uma grande repercussão no Brasil. Com o extermínio de pessoas em Canudos conhecido por “gravata vermelha“ ou degola, onde várias pessoas foram mortas mesmo depois do fim da guerra, ocasionando um número grande de órfãos. Um caos sanitário e humano se instalou em Canudos e crianças eram vendidas e levadas para Salvador, tendo militares do Exército Brasileiro realizando negócios com estas crianças, vendendo-as à população da capital baiana. A sonegação de informações não baixou o ímpeto do comitê, que obteve grandes êxitos na procura por crianças e as matriculando em colégios e abrigando-as em orfanatos, investimento na sua educação e profissionalização, para que se tornassem cidadãos livres e trabalhadores na sociedade brasileira. Com a ajuda de diversos cidadãos e grupos filantrópicos, aconteceu essa grande contribuição para o futuro social destas crianças.
     O secretário do comitê patriótico da Bahia, que auxiliou as vítimas de Canudos, enxergou nas mulheres e crianças desamparadas, algo mais do que bandidos a serem exterminados por causa das brigas políticas e religiosas, relacionadas à guerra. Houve diálogo entre jornalistas, padres e sobreviventes da guerra, diversificando assim a linha de assistência. A ação humanitária do comitê obteve sucesso em favor dos atingidos, encaminhando várias crianças e adolescentes para viverem com sobreviventes das suas famílias e dando uma oportunidade aos que não conseguiram, através dos estudos e do trabalho, a fim de que superassem os traumas vividos e seguissem suas vidas.

QUAL FOI O DESTINO DE JAGUNCINHO, ÓRFÃO LEVADO DE CANUDOS POR EUCLIDES DA CUNHA, PARA SÃO PAULO?
     A professora de mestrado da PUC – Rio, Vanessa Sattamini Vaarão Monteiro, nos brinda com a pesquisa sobre Jaguncinho, e seu interesse pelo tema foi despertado através de uma pergunta do professor José Calazans (1915 – 2001), um dos maiores especialistas na Guerra de Canudos: "Onde está Jaguncinho?" Trazido para São Paulo, por Euclides da Cunha, foi um "presente" do General Arthur Oscar, comandante da quarta e última expedição militar ao arraial.
     A pesquisa começa depois de 1908. Euclides da Cunha entrega Jaguncinho ao seu amigo e educador Gabriel Prestes, que se encarregou de criá-lo e educá-lo. Se formou em professor primário em 1908, e passou a adotar o sobrenome do tutor “Ludgero Prestes”. Com a carta enviada em 1908, para Euclides da Cunha, onde o felicita pela sua ascensão social e educacional e por fazer parte deste momento feliz da vida de Ludgero Prestes. A busca pelo destino de Ludgero Prestes pela professora Vanessa Sattamini, vai até à cidade de Bebedouro, em São Paulo. Uma escola da cidade teve como primeiro diretor, o professor Ludgero Prestes. As investigações não obtiveram grandes êxitos em seu início, mas tomou um horizonte, o que a levou à pesquisa das nomeações de diretores e professores do Estado de São Paulo, neste período. Enfim, se encontrou o registro de nomeação do professor Ludgero prestes no cargo de diretor da escola Caetano de Campos, em São Paulo. Com novas pesquisas na rede estadual de ensino através do “Diário Oficial”, descobriu-se a nomeação de Ludgero Prestes como diretor interino na escola de Bebedouro e o pedido de transferência desse diretor para uma mulher, que deveria vir de Serra Negra para Bebedouro. Atentou-se para o nome da mulher: Beatriz da Cunha Lima Prestes. Progredindo na pesquisa, foi encontrada pela professora Vanessa Sattamini, a certidão de casamento do professor Ludgero com Beatriz, onde constava como local de nascimento de Ludgero Prestes, justamente o arraial de Canudos, na Bahia. Seus pais tinham o mome de João Luiz e Maria Luiz.
     Ludgero Prestes foi professor em Serra Negra, diretor interino do grupo escolar de Bebedouro e professor em Amparo, local de seu falecimento em 13/10/1934, aos 43 anos, tendo por causa mortis, câncer de fígado. O professor Ludgero deixou quatro filhos. Ele era a memória viva dos acontecimentos de Canudos, que nunca foram apagados de sua memória, como muitos queriam após o fim da guerra. Teve a honra de assumir o sobrenome da família Prestes, que o criou e educou, por gratidão. Mas nunca retirou da certidão de casamento o nome dos seus pais biológicos, fazendo questão de nunca se esquecer das suas origens.
     Mesmo com a destruição do povoado de Canudos, em 1897, tentou-se realizar uma segunda destruição em 1968 - dessa vez da memória histórica, mantida pelas ruínas do arraial. Com a construção do açude de Cocorobó, os moradores que voltaram para região foram relocados para outra região, que recebeu o nome de Nova Canudos. No período dos vazamentos as ruínas de Belo Monte, aparecem revivendo as memórias que muitos queriam que fossem esquecidas. A professora Vanessa Sattamini, refaz a pergunta do professor Calazans. “Quem sabe de perguntas sobre Jaguncinhos para nos fornecer?” Existem vários Jaguncinhos prontos para serem descobertos por outros pesquisadores do Brasil.

Por Jair de Lima                                          

2 comentários:

  1. Segundo o Pesquisador Fabio Fredini - Especialista PUC SP, que trabalhou no Projeto da História da Educação Paulista contribuiu para a pesquisa do Reporter Fernando Granato

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